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Relato de estudante sobre a fome causa repercussão nas redes sociais e amplia debate sobre evasão

  • Publicado: Terça, 19 de Junho de 2018, 17h36
  • Última atualização em Quinta, 21 de Junho de 2018, 16h26
  • Acessos: 6564

FomeO estudante Rodrigues Silva do curso de Ciências Sociais da Unifesspa fez um relato sobre a fome que chamou a atenção de inúmeros usuários das redes sociais. A postagem foi feita na tarde do último sábado (16) e conta com dezenas de comentários e diferentes reações de internautas, que se solidarizavam e encorpavam a reflexão sobre a realidade de muitos estudantes universitários de baixa renda, que enfrentam o drama de não ter sequer a alimentação diária garantida. Enquanto isso, precisam dar conta de uma intensa atividade acadêmica, entre outros compromissos impostos pela vida universitária.

“Você sabe o que é a fome? Sabe o que é não ter nada em casa pra comer? O que é não ter dinheiro para poder se alimentar? Já sentiu o desespero de perder a razão e ter que fazer coisas que nunca imaginava fazer como, roubar ou pedi, só pra comer? A fome doí”, escreveu o aluno, causando impacto e abrindo o debate e reflexão sobre o tema.

De acordo com o estudante, estar na universidade nem sempre pode ser observado como um privilégio. “Em mais de um ano que estou em uma universidade a coisa que eu mais convivi em todo este tempo foi com a fome. Sou cotista, oriundo de escola pública e com uma família que ganha menos de um salário mínimo por mês, ou seja, ingressei na universidade por cota de escola, e renda. E você quer saber como é a vida de um universitário pobre que faz hoje ensino superior em outra cidade ou estado que não é a sua de origem? É uma vida de fome”, desabafa.

Em seu texto, Rodrigues Silva relata, ainda, as dificuldades sobre o acesso a auxílios que possam favorecer a permanência estudantil e a dificuldade de sobrevivência com o baixo valor das bolsas comparado ao alto custo de vida na cidade. Segundo ele, o objetivo do texto era trazer à tona essa reflexão sobre a realidade de muitos estudantes universitários, problema real que tem motivado a evasão e insucesso acadêmico de muitos alunos.

“Quando escrevi esse texto, meu objetivo era fazer com que a Universidade e a sociedade em geral reflitam sobre essa realidade que não é exclusiva da Unifesspa, mas que precisa ser repensada em seus pontos falhos. É preciso desmistificar essa ideia de que a bolsa resolve todos os problemas. Quem é cotista na universidade sabe que a dificuldade é muito maior. É preciso se organizar de diversas formas para solucionar esse problema, para além da burocracia dos editais, porque a fome não espera”, reforçou.

Rodrigues Silva é aluno do curso de Ciências Sociais, atualmente é bolsista da Proex/Unifesspa. Além dos textos nas redes sociais, ele alimenta um blog ( https://escvreversobreviver.blogspot.com/ ) com poemas, poesias e textos reflexivos sobre diversos temas sociais.

Confira o texto na íntegra, postado em seu perfil numa rede social:

FOME

Você sabe o que é a fome? Sabe o que é não ter nada em casa pra comer? O que é não ter dinheiro para poder se alimentar? Já sentiu o desespero de perder a razão e ter que fazer coisas que nunca imaginava fazer como, roubar ou pedir, só pra comer? A fome doí. Em mais de um ano que estou em uma universidade a coisa que eu mais convivi em todo este tempo foi com a fome. Sou cotista, oriundo de escola pública e com uma família que ganha menos de um salário mínimo por mês, ou seja, ingressei na universidade por cota de escola, e renda. E você quer saber como é a vida de um universitário pobre que faz hoje ensino superior em outra cidade ou estado que não é a sua de origem? É uma vida de fome. Ok, estou na universidade, tem dinheiro do governo para assistência estudantil. Para ter acesso a esse recuso as vezes chega a ser humilhante. Já não basta ter vindo de escola pública e ter um renda de menos de um salário mínimo, e ter que provar para ter acesso a cota, tenho que também correr atrás de uma pilha de documentos que vão novamente provar que sou pobre e de escola publica e uma série de outras questões. É necessário tudo isso? é, mas até você ter acesso a este recuso, o intervalo até receber, é de fome. A instituição diz uma especie de, "dá os teus pulos, porque nós só podemos fazer algo, quando sair os editais". É foda. Ok, agora que recebo auxilio, vou pagar o aluguel e comprar comida e tudo certo. Mas não é bem assim. O preço dos imóveis perto da universidade é altíssimo, se for morar em um lugar pequeno com muitas pessoas, conforto é uma coisa que não vai existir, um quarto pra três pessoas, um mini quarto. Se quer uma casa melhor, vai pagar caro, vai ter que sair da boca. E você só vai pagar conta, comer e estudar. Isso é um verdadeiro inferno. O numero de estudantes com depressão é altíssimo, ansiedade tá nos matando aos poucos, o consumo de drogas licitas ou não licitas, é a válvula de escape, ou a degradação deste quadro. Ou somos nós produtores de cultura, festas, diversões, de coisas que são para nos distrair, ser feliz, aproveitar de uma outra forma, sem ter que somente estudar, ou não vai ter nada, nunca teremos acesso a nada.

EU NÃO SOU UM PRIVILEGIADO POR ESTA EM UMA UNIVERSIDADE. E aqueles que desistem ainda são chamados de fracassados. Não, eles não são. Todos os dias eu penso em desistir de tudo isso, dessa vida que levo hoje, mas eu enfrento todos os dias a pior coisa que um ser humano pode passar, que é a fome. Desistir de que? pra que? E se eu quiser ninguém nunca terá nada haver com isso. Mas muitas coisas boas também acontecem, que me faz pegar todo o ódio que sinto de ver como essa imensa desigualdade é desumana, e transformar em sorrisos, poesias, músicas, fazer amizades, conhecer pessoas incríveis, aprender e tira coisas boas de toda essa desgraça que acontece ao meu redor, transborda amor, em tudo, como um amigo me disse ontem. Mas não, não tá nada bem. Tu acha mesmo que tudo está bem? bem pra quem? Não estou aqui com estas palavras, querendo ajuda, ou qualquer coisa do tipo, porque se preciso de algo, eu recorro às pessoas, e ao que está ao meu alcance. Talvez esse seja mais uma relato pra gente ver e pensar, que universidade, ensino superior, não é para todos. Pois talvez ingressar é um passo, para os mais pobres como eu, mas permanecer e sair dessa instituição é muito mais complexo do que parece. Infelizmente ainda hoje o ensino superior só revela como este país é desigual.

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